domingo, 13 de março de 2016

O caminho do guerreiro







      O budô é uma derivação do antigo bujutsu (conjunto de disciplinas que eram aplicadas em batalhas no período Sengoku 1467 - 1573).  Ao contrário deste conturbado período de guerras, onde os samurais lutavam por sobrevivência, o período Edo (1603 - 1867), foi marcado pela paz no Japão. Com o fim das guerras as técnicas de lutas dos guerreiros foram ensinadas às pessoas comuns, com ausência de inimigos as lutas ganharam características filosóficas e esportivas.   
        O budô é mais freqüentemente traduzido como "o caminho da guerra" ou "caminho marcial ", enquanto bujutsu é traduzido como "ciência da guerra" ou "ofício marcial". No entanto ambos, budô e bujutsu, são utilizados com o termo "arte marcial".
        O budô e o bujutsu têm uma diferença bastante delicada. Enquanto o bujutsu só dá atenção para a parte física de luta (a melhor maneira de derrotar um inimigo), o budô também dá atenção para a mente e como se deve desenvolve-la. O budô moderno usa aspectos do estilo de vida dos samurais do Japão feudal e os traduz para o auto-desenvolvimento na vida moderna
     No mundo moderno existem os guerreiros ''disfarçados'' de operários, engenheiros, arquitetos, advogados etc, fazem do trabalho, seu campo de batalha e usam as artes baseadas no budô como estilo de vida, BU = guerreiro, DO = caminho.

    Dentre os mais variados estados de espíritos desenvolvidos no Budô hoje vamos abordar dois: o mushin e o muga.


    Mushin 
Mushin literalmente significa inocência. Refere-se ao estado de espírito onde a pessoa não assume nenhuma postura, mas está aberto e preparado para qualquer coisa e/ou situação, o que é vital para o combate real. Mushin é um estado de espírito alcançado através de treinamento duro e estratégico. A prática repetitiva aliada a conceitos importantes de combate tem o intuito de criar uma memória muscular fazendo com que os movimentos físicos deixem de exigir qualquer pensamento para comanda-los.

Podemos ilustrar o mushin com uma antiga lenda japonesa:
 “  Um dia, um samurai, se dirigiu ao templo e rendeu homenagens para o Deus local pedindo que este lhe ensina-se o segredo para vencer seus combates. Ao descer os degraus do templo, ele sentiu a presença de um monstro. Por intuição, ele desembainhou sua espada e num instante matou o monstro.     O sangue jorrou e derramou-se pelo chão. Ele matou-o inconscientemente. O Deus local não lhe deu o segredo para a vitória, mas graças a esta experiência, no caminho de regresso, ele compreendeu-o. Não pode haver pensamento na prática do Budô. Não há um só segundo para pensar.    Quando agimos, a intenção e a ação devem ser simultâneos. Se dissermos : ” O monstro está ali, como matá-lo? “, se hesitamos, só o cérebro frontal entra em ação. 


Muga
Rocky Balboa ( exemplo do estado muga na ficção) 

       Muga significa o não ego, a não existência, a raiz Mu também significa perder algo e isso pode ser encarado como, por exemplo, perder os maus hábitos, perder as restrições, inibições, medos, etc. Em japonês Muga é algo que se alcança em um estado de espirito quando você perde as limitações do ego, que se deixa fluir, plenamente concentrado no ato, no presente, supõe-se que neste estado uma pessoa possa alcançar feitos que não eram imaginados ser capaz. 
      A primeira vez que me deparei com a palavra muga, foi durante uma conversa com o sensei Carlos Eduardo Carvalho onde ele contava a historia de como conseguiu a faixa preta internacional de Kudo. Para conseguir o 1º dan de Kudo, sensei Carvalho teve que lutar 12 vezes e ganhar no mínimo 60% das lutas, no exame dele não colocaram restrições de idade nem altura nem peso, dessa forma ele tinha que enfrentar qualquer adversário que lhe fosse designado. 
       Com uma lesão no ombro ele não pôde se preparar tão bem fisicamente quanto gostaria e ainda sentiria a lesão durante o exame. Ele conta que chegou um momento onde apanhou tudo que tinha que apanhar, que a dor, o cansaço e o medo deixaram de ser importantes, que o futuro e o passado não existiam, nem mesmo ele neste momento ''existia '' mais, assim ele entrou no estado muga, focando apenas em seu objetivo, conseguiu chegar ao fim do exame alcançando as vitorias que precisava. Essa é uma exemplificação bastante visceral do estado muga. 
    Concluem-se que, através do treino e repetição constantes criamos memória muscular, ao moldarmos nossa mente enfrentando desafios, lutas e situações adversas que nos forçam a usar aquilo que treinamos, nos podemos atingir o Mushin, respondendo automaticamente aos estímulos exteriores.
         Já o estado de Muga só pode ser atingido quando, apesar da dor, medo e cansaço, nos mantemos focados naquilo que queremos, sem nunca desistir, mesmo quando as adversidades parecem maiores que nossas habilidades, podemos supera-las se nossa mente for mais forte.
    Então podemos dizer que no caminho do Kudo que é uma arte dentro do Budô podemos desenvolver diversos estados, o Kudo é descrito como a estrada da mente aberta, e o caminho traçado quem escolhe é o praticante.